segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Criança pode usar maquiagem? Questão divide pais e especialistas

Os olhos esverdeados da pequena Maria Gabriela Couto, de 3 anos e meio, brilham diante do estojo de sombras das Meninas Superpoderosas. Depois de pegar a maquiagem numa maletinha cor-de-rosa, a menina segura o pincel meio sem jeito e mistura verde, laranja e amarelo, extrapolando o limite das pálpebras. Na sequência, faz caras e bocas ao passar um microbatom roxo. Para completar, pinta as unhas de azul. — Que linda! — exalta a própria, num autoelogio diante do espelho de sua penteadeira da Barbie, enquanto assopra os dedos e abana as mãos para o esmalte secar. A menina ganhou o kit de beleza há cerca de duas semanas. Foi presente de sua mãe, a advogada Anna Beatriz Couto, de 30 anos. — Nos últimos tempos, a minha filha estava pegando todos os meus batons e sombras no banheiro. Para a sua própria segurança, comprei maquiagem infantil, que sai com facilidade no banho, sem a necessidade de demaquilante — explica. — Sei que criança tem a pele sensível, mas minha filha nunca teve alergia. Ela começou a se pintar há uns seis meses. Particularmente, não vejo problema. É uma brincadeira. Quando uma criança pode começar a usar maquiagem? A questão divide opiniões entre pais e especialistas. A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), por sua vez, lançou há um mês uma consulta pública com novas regras para 33 cosméticos infantis, destinados ao público de 0 a 12 anos, liberando a entrada de desodorantes e sombras neste segmento do mercado. O objetivo é atualizar a última legislação, que data de 2001. Pelas novas regras, a sombra, assim como o batom e o brilho labial, poderão ser usados por crianças a partir de 3 anos, desde que aplicados por um adulto. A partir dos 5, a própria criança poderá manipular os produtos, mas ainda com supervisão do responsável. — Além de detalhar esse tipo de especificação, a regulamentação determina que os testes feitos com os produtos para avalização da toxidade e a comprovação de ausência de irritabilidade devem constar nos rótulos das embalagens — completa o farmacêutico industrial Marcelo Sidi Garcia, integrante da equipe da Anvisa que está analisando a opinião da população sobre as novas indicações e proibições, em Brasília. Os brasileiros têm mais 30 dias para opinar sobre a cartilha, enviando opiniões pelo site da instituição, em http://portal.anvisa.gov.br. As novas medidas aumentarão as exigências para os cosméticos infantis chegarem às prateleiras de farmácias e lojas de departamento com mais segurança. Mas, por outro lado, dermatologistas e pediatras temem que elas acabem por incentivar o consumo. Nos últimos cinco anos, dobrou o faturamento do setor. Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos, o mercado infantil faturou R$ 1,12 bilhão em 2011. — A atualização da legislação é importante para dar limites à indústria e ao consumidor. Só não pode ser usada para estimular o consumo, pois estamos falando de um público sensível — ressalta a dermatologista Vivian Amaral, que cuida de adultos e crianças em seu consultório. — A pele da criança é mais fina, e absorve qualquer substância com facilidade. Por isso, recomendamos maquiagens com baixa concentração de álcool, que pode ser retirada apenas com água. Se os cosméticos forem usados de forma lúdica e com moderação, não há problema. Qual menina nunca quis imitar a mãe se maquiando no espelho ou pegou “emprestado” um salto alto? Salões infantis costumam receber crianças para festas de aniversário A atriz Ciça Banal, de 11 anos, começou a se pintar quando ainda usava fraldas. — Eu devia ter 2 anos quando passei batom pela primeira vez — conta Ciça, que desde que entrou para o elenco de “Balacobaco”, a próxima novela da Record, acostumou-se a usar rímel. — Gosto de rímel preto, transparente não tem mais graça. Sua mãe, Valéria Simões, a interrompe: — Procuramos sempre maquiagem antialérgica, pois, quando a Ciça era menorzinha, ficou com as bochechas empoladas. Semana passada, Ciça foi do colégio diretamente para o salão de beleza infantil Glitz Mania, inaugurado há um mês no Shopping da Gávea. Sentada numa cadeira rosa chiclete, e observada pela mãe, a atriz mirim foi maquiada por uma profissional da casa, que cobra R$ 28 pela chamada “maquiagem social”. Ou seja: corretivo para “atenuar” as (inexistentes) olheiras, sombra azul, rímel, blush e gloss. A “maquiagem artística”, que utiliza pincel e tinta especial para desenhar leão e borboleta, entre outros personagens no rosto da criança, sai por R$ 55. — O público infantil é muito consumista. Além disso, muitas vezes as mães abrem mão de fazer os serviços de beleza para as filhas poderem fazer maquiagem, unha, escova e hidratação — comenta o empresário Arnaldo Schipper, que trouxe a franquia do Glitz Mania de São Paulo, onde a rede tem cinco salões, para o Rio. Um dos primeiros salões infantis da cidade, o Fashion Mix, na Barra, coleciona clientes como Sasha Meneghel e Lívia Aragão e costuma receber crianças para festas de aniversário. Nas comemorações, a maquiagem está incluída no pacote de mimos oferecidos para as convidadas. — Só fazemos maquiagem em menores de 6 anos com autorização dos pais — diz a maquiadora Andreia Gabriela da Silva, há cinco anos no salão. — O batom rosa nunca sai de moda entre as meninas. Tento sugerir um lilás, para combinar com os vestidos, mas não cola. Tenho preocupação em não deixar uma criança com cara de miniadulto. Tenho uma afilhada de 10 anos que passa lápis de olho para ir à escola. Acho isso um absurdo. Há 43 anos no mercado de beleza, o maquiador Gilles Pereira se recusa a passar base, lápis de olho ou rímel em menores de 15 anos que se sentam na cadeira de sua sala, no Maison Vitalícia, em Ipanema. — Outro dia, uma mãe me obrigou a pintar uma criança de 11 e outra de 12 anos com cara de mulher! É um crime. Quando essas meninas chegarem aos 15, a pele vai estar toda estragada — adverte. — Quando me pedem para maquiar daminhas de honra de 3 anos, passo blush e um pouco de gloss, sem exagero. É preciso um mínimo de bom senso. O pediatra Daniel Becker compartilha da mesma opinião. Ele acredita que crianças não devem ser levadas a festas com os rostos exageradamente pintados: — Isso é projeção exagerada da vaidade materna. As mães querem competir para saber quem tem a filha mais bonitinha. O médico acha saudável que meninas brinquem de salão de beleza. A questão, segundo ele, começa a ficar mais delicada (e polêmica) a partir dos 7 anos: — A maquiagem é um instrumento de sedução e pode agregar conotação erótica. Crianças de 7, 8, 9 e 10 anos estão entrando precocemente no mundo da beleza artificial. Antes, as meninas começavam a dar beijinhos aos 13. Hoje, estão começando a beijar aos 8! Esse fator é brutal. Se mulheres maduras sobrevivem sem maquiagem, uma criança também consegue viver sem um batom. Leia mais sobre esse assunto em http://ela.oglobo.globo.com

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