quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Clima sêco e sintomas

Várias cidades brasileiras estão em estado de alerta por causa do tempo seco. E nesse inverno da secura, a gente pergunta: como é que você está se sentindo? O que realmente acontece com o nosso corpo? E como é possível sobreviver nesse deserto?

O ar seco, bem abaixo dos 60% de umidade considerados ideais, está fazendo moradores de São Paulo, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e Paraná lotarem os hospitais e sentirem uma sede fora do comum.

Para respirarmos bem, o pulmão precisa estar 100% úmido. Quando o ar que inspiramos só tem 20% de umidade, por exemplo, todo o corpo "empresta" os 80% de água que falta.

“A cada inspiração e expiração eu estou perdendo água para dentro do pulmão”, explica o fisiologista Paulo Zogaib.

É preciso repor essa perda. O corpo aproveita melhor líquido fresco em pequenas quantidades. “Você não pode se desidratar para depois se hidratar ou reidratar. Você tem que manter a hidratação”, ensina o fisiologista.

“Qualquer lancezinho de escada que eu subo eu fico ofegante. O nariz entupido é o pior de todos, porque dificulta muito a respiração”, diz uma mulher.

Olhos, nariz, a traquéia que leva o ar ao pulmão, todos produzem o muco, uma camada protetora. A baixa umidade do ar resseca o muco. Essas células, chamadas ciliadas, que em dias normais, funcionam como uma "vassoura" contra a poeira e outros invasores, são prejudicadas pelo muco seco e espesso. Os cílios não batem direito: daí as infecções respiratórias serem tão comuns no tempo seco. Pior quando há poluição.

“Nesse momento em que estamos mais frágeis, nós estamos recebendo um ar de pior qualidade. Então, você junta dois fatores que se potencializam e o resultado é o adoecimento”, explica Paulo Saldiva, do laboratório de Poluição Atmosférica

Umidade a 70% em Manaus. “Transpira muito, é o tempo todo suado”, reclama Edmilson.

O Edmilson viajou de Manaus a São Paulo e já está sentindo os efeitos do clima. Ele conta que já amanheceu com o nariz entupido. E topou participar de um teste: vai ser analisado por uma equipe de especialistas que vai medir os efeitos do ar seco nos olhos, no sistema respiratório e até no coração.

Os testes avaliam infecções, a capacidade do pulmão, o interior das nariz, os olhos. Coração e pressão são monitorados.

Edmilson sai para conhecer a cidade em um dos dias mais poluídos do ano. Ele avisa: “O nariz está incomodando”.

Sete horas depois, os exames são refeitos no Incor e no Hospital das Clínicas. Comprovado: as narinas estão ressecadas. O muco, mais espesso, deixou a respiração 40% pior. A receita é soro fisiológico no nariz.

“Isso pode ser feito nas duas narinas, várias vezes ao dia. Quanto mais fizer, melhor” recomenda a otorrinolaringologista Maria Dantas Godoy.

“Ele saiu com o nariz bom e volta com o nariz inflamado”, explica o médico Paulo Saldiva.

A qualidade da lágrima também piorou e a pressão subiu.

“A gente imagina que a poluição vai trazer algum dano, mas não que tão rapidamente a gente ia sofrer”, diz Edmilson.

São Paulo deve ter uma chuva leve no começo da semana, mas a seca continua na cidade e no restante do Brasil em setembro. Enquanto a chuva forte não vem, veja como vivem os moradores de Brasília, uma das cidades mais secas do Brasil.

Verde do gramado some em Brasília
Em Brasília, onde foi parar o verde do gramado? Sumiu. E este é apenas um dos efeitos da seca. Tem mais: “Dificuldade para respirar, para dormir”, reclama um homem. “A pele fica muito seca, parece que ela está rasgando”, diz uma mulher. A seca vai de abril a setembro, todo ano. Por isso, cada brasiliense tem sua estratégia de sobrevivência.

O efeito da seca é ainda pior nas horas mais quentes do dia. À 13h30, de sol a pino, é importante buscar uma sombra pra se proteger. Mas se você não tem à mão um chapéu ou sombrinha, vale o improviso.

A dona de casa Elenilde já se tornou especialista. A família mora em um assentamento. A poeira agrava os efeitos da falta de umidade. Preste atenção nas dicas da família: As crianças só podem brincar do lado de fora, quando o clima refresca, a poeira não fica acumulada e deve-se beber água o tempo todo. Creme hidratante também deve ser usado sempre.

E na hora de dormir, uma toalha molhada perto da cabeça e um balde cheio de água no chão.
“Ajuda os meninos a respirar melhor e dormir melhor”, disse a faxineira Elenilde dos Santos.

A seca só não é pior porque quando a cidade foi criada, houve a preocupação de plantar uma espécie de cinturão verde entre os edifícios. “Existe água no subsolo e as plantas então retiram essa água e jogam para a atmosfera”, explica o ecologista Paulo Salles.

O Lago Paranoá também ajuda. Quem mora perto da água nota a diferença. “Quando a gente vai à cidade, a gente sente o ar mais seco, sente um incômodo”, diz a empresária Cláudia Lacerda.
Água é fundamental”, diz patologista da USP sobre cuidados em época de clima seco

Em chat com internautas do Show da Vida, o médico Paulo Saldiva apontou dicas para combater os problemas de saúde causados pela baixa umidade do ar.

O patologista da Universidade de São Paulo (USP), Paulo Saldiva, participou neste domingo (29) de um chat com internautas do Fantástico e tirou dúvidas sobre os principais problemas de saúde causados pela baixa umidade relativa do ar. Durante o bate-papo, ele apontou sintomas recorrentes do período seco e apontou dicas para evitá-los. Segundo o médico, o fundamental é aumentar a ingestão de água e manter uma dieta leve.

Veja os principais trechos da entrevista

Sangramento nasal

“Quando o nariz sangra, significa que já há um grande prejuízo à função nasal. Quando dói é sinal de rinite, mas quando há sangramento, significa que houve uma espécie de úlcera na mucosa nasal. Não se deve chegar nisso. Pingar qualquer soro fisiológico de quatro em quatro horas ajuda muito, especialmente entre 10h e 16h. Depois desse período, a umidade do ar tende a aumentar”, explica o médico Paulo Saldiva.

Doenças respiratórias

“Para a maior parte das pessoas, o clima seco só leva a um desconforto, uma situação de fadiga no final do dia. Como nosso sono se altera um pouco nesse período, pela obstrução das vias aéreas, a gente levanta mais cansado do que normalmente. Existem pessoas mais frágeis, como crianças e idosos. Percebemos que nesse período do ano os hospitais ficam lotados de gente com doenças respiratórias. Então, é preciso tomar cuidado quando você começa a ter uma febre alta, tosse, dor torácica, sensação de cansaço em tarefas cotidianas, dor com a inspiração, dor quando tosse. Nesses casos seria conveniente procurar um médico”, alerta o patologista.

Utilização de umidificadores de ar

“Os umidificadores funcionam e são recomendados se houver um local muito seco, próximo a um corredor de tráfego, se existir na casa alguém com sintomas de nariz sangrando, coriza ou conjuntivite. Nesses casos, ele pode ter uma função protetora, sim. Os horários de utilização devem ser os mesmos nos quais a umidade diminui, de 10h às 16h. Não é necessário dormir com umidificador ligado. À noite, há uma reconstituição da umidade do ar para níveis bem mais toleráveis. Um cuidado tem que ser tomado com os umidificadores: eles precisam ser lavados todos os dias, com água e sabão. Toalha úmida, bacia de água ou gotas nasais podem substituir o aparelho. Um banheiro com bastante vapor de água também é importante para recompor a umidade. Há várias alternativas para restaurar o ambiente. Mas o principal é beber muita água. Água é fundamental”, afirma Paulo Saldiva.

Cuidados com crianças e idosos

“Para crianças pequenas, é preciso oferecer muita água, pois elas perdem mais água nesse período. Para os idosos também. Eles têm a pele mais fina, transpiram mais, podem perder água e não sentir muita sede. Inclusive alguns geriatras recomendam um copo a cada duas horas. Isso é importante, desde que o idoso não tenha doença renal ou cardíaca, para não haver sobrecarga de volume. Mas essa perda de água pode, em circunstâncias extremas, levar a um risco de doença cardíaca, que também acontece nesse período”, informa o médico.

Cuidados em ambientes climatizados

“O ar condicionado é sempre um fator de ressecamento a mais. Tanto é que ele tem aquela bandejinha que fica pingando a água que ele retira no processo de resfriamento. Se existe um ambiente com ar condicionado ou climatizado seria importante um nebulizador, ou comprar um medidor da umidade relativa do ar, que é barato, e acompanhar para ligar um nebulizador nos períodos críticos. Utilizar as gotas nasais também ajuda bastante”, diz o patologista Paulo Saldiva.

Sintomas amenizados nas cidades litorâneas

“As pessoas que moram em cidades litorâneas sofrem menos com o tempo seco. A brisa marítima sopra do oceano para o continente no período do nascer do sol até o final tarde e à noite ocorre o inverso. Isso significa que no período de maior insolação, a brisa está vindo do oceano trazendo a umidade do ar. Então, as cidades litorâneas, em geral, não passam pela mesma situação”, revela o médico.

Atividades físicas e alimentação x clima seco

“O melhor horário para fazer atividades físicas ao ar livre em locais secos é o de antes das 8h ou 9h, ou então depois das 17h ou 18h. Esse seria o ideal. O que seria proibitivo é exercer atividade física na hora do almoço, com altas temperaturas e baixa umidade do ar. É importante também manter uma alimentação com frutas, uma alimentação leve, que reponha potássio, que é o que a gente perde um pouco mais, e sódio. Uma dieta leve, com frutas e hortaliças, é a adequada para esse período do ano”, explica o especialista da USP Paulo Saldiv

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